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sábado, 25 de julho de 2015

Viver com Epilepsia ou a Tentativa de Uma Vida Normal

Não tenho por hábito falar disto, uma vez que se trata da minha vida pessoal e não gosto de incomodar as pessoas com relatos do que é viver com uma doença crónica - todos nós temos problemas, de um tipo ou de outro, e ninguém tem que me aturar os desabafos.

Mas também não escondo de ninguém (amigos, colegas, chefes) que sou epiléptico e que a qualquer momento me pode dar uma traquitana e começar a estrebuchar no chão e a babar-me como um rottweiler com raiva. Não me parece que seja epiléptico seja nenhum motivo de vergonha, mas são exactamente algumas atitudes que já experienciei que me levam a escrever hoje.

A epilepsia não é uma doença fácil de controlar. Exige moderação em tudo - moderação essa que não é fácil de praticar para mim - e medicação constante, medicação essa que impede ataques mais graves, mas que também nos torna um pouco em zombies e que leva a alterações de humor constantes, o que, admitamos, não é nada agradavél para quem vive connosco e tem que nos aturar.

Supostamente, com epilepsia, não podemos trabalhar com computadores (a minha profissão), não podemos beber café (o meu maior vício) nem podemos beber álcool (embora não seja alcóolico, também não sou abstémio de todo). Não posso estar em locais com muitas luzes (discotecas incluídas, embora isso nada me incomode) nem posso viver sozinho por muito tempo, uma vez que um ataque epiléptico sem ter ninguém que me ajude me pode levar desta para melhor (o que para uma pessoa um pouco anti-social como eu não é fácil).

Existem pessoas que comentam que eu sou distraído, que referem a minha abstração de formas menos agradáveis (usualmente pelas costas, mas tudo se sabe, meus amigos) e que se esquecem que viver com algo que nos pode transformar num vegetal dependente de outros (pelo menos durante algumas horas ou dias) a qualquer momento não é nada fácil.

Fazer EEG's todos os semestres, perder tempo em hospitais e farmácias a tentar encontrar a dose certa do medicamento (o tal que nos transforma em zombies) também não é a melhor forma de passar os dias. Não poder conduzir, não poder ir para locais mais exóticos onde o dito medicamento não exista, não poder estar em locais com muito barulho, ser muitas vezes rude com pessoas apenas porque nos dói imenso a cabeça também não ajuda a ter uma vida social decente. Além disso, a vida amorosa sofre bastante - quem raio quer passar o resto da vida com uma pessoa que pode virar uma beterraba de um momento para o outro (para além de poder morder e partir metade dos móveis na casa e alguns dentes quando tem um ataque)?

A coisa engraçada da epilepsia é que, sendo uma doença que afecta milhões de pessoas, tem uma terrível falta de informação sobre ela. Sempre que digo que sou epiléptico, a primeira questão (depois do eventual "coitadinho" e de me perguntarem se me vai dar um ataque e porque estou a beber café) é "se te der uma coisa, o que é que eu faço???". Ninguém - a não ser que tenha um epiléptico na família - sabe o que fazer na eventualidade de um ataque e parecem ficar muito assustados por fazermos uma vida normal (ou tentarmos).

Sendo uma doença crónica, outra coisa que me dói é termos que pagar por medicamentos. Senhores, eu não posso viver sem o ácido valpróico - ou transformo-me numa batata. Não tenho tempo para ir a um neurologista sempre que preciso de medicamentos - digamos que os hospitais públicos não os têm em abundância e os neurologistas privados são um "pouco" caros (para não pensarem que estou a exagerar, estive uma vez num hospital público 12 horas a aguardar consulta, já que as consultas de neurologia levam tempo, e quando fui a um neurologista privado, tive 4 minutos de consulta - o diagnóstico dele depois de olhar para o EEG foi "você tem epilepsia", como se eu não soubesse já e paguei 80 Euros) e se for com uma receita de um médico de família, tenho que pagar.

Peço desculpa pelo rant, mas quando alguém me chama retardado por ter epilepsia, tendem a acontecer estas coisas.


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